PROJETO SEMENTES'22 | DIÁRIO DE MISSÃO 11

Enquanto escrevo este diário de missão, vou sendo invadido por imensas recordações que tenho vivido nestas últimas 4 semanas e do quão bonita tem sido esta missão. A realidade é que esta missão provavelmente será uma das maiores e mais gratificantes experiências que a vida se encarregou de me dar. Todo o caminho feito até ao dia de hoje demonstrou a resiliência de cada um dos elementos do grupo face às adversidades, a bondade e amizade nos gestos altruístas e a alegria de poder aproveitar cada dia de missão como se do último se tratasse.

Durante o último fim de semana, tivemos a oportunidade de visitar Suru com alguns jovens da comunidade e, durante o caminho, fui invadido por um sentimento de perplexidade perante a beleza desta que já posso chamar “nossa” Guiné-Bissau. Foi, sem dúvida, uma tarde memorável de partilha de histórias e de vivência de novas experiências, onde tivemos a oportunidade de experimentar o famoso caldo branco guineense. Na verdade, nem a chuva que se faz sentir nesta época chuvosa nos fez arredar pé desta nossa aventura.

Nesta semana, tivemos a oportunidade de finalizar e de nos despedir da comunidade que trabalha e se encontra no hospital de Cumura, com o sentimento de dever cumprido, mas também com a perceção de que ainda há muito para ser feito. O hospital foi o local onde trabalhamos arduamente durante todas as manhãs, quer auxiliando nas consultas, quer na parte mais administrativa, ou mesmo na parte mais ligada à engenharia e maquinaria. Pessoalmente, sinto que o trabalho que aqui desenvolvemos foi muito gratificante e que a nossa colaboração foi uma mais valia para todos. 

As últimas tardes desta missão foram passadas com as crianças e jovens da comunidade onde realizamos as últimas atividades, sempre com um sentimento agridoce, visto que sabíamos que seriam as últimas, mas nunca nos esquecendo que os nossos nomes ficarão marcados, quem sabe talvez durante uma vida nos corações destas crianças e jovens e que levaremos connosco tudo o que recebemos desta massa humana tão rica e única. 

Num deambular de pensamentos que me vão ocorrendo durante esta última semana, penso como será acordar daqui a uns dias e quando sair à rua não ouvir ninguém a chamar pelos nossos nomes com a garganta bem afinada e com a voz bem colocada para que os chamamentos não tenham sido em vão. Ou mesmo, passar por toda a gente de sorriso rasgado seguido de um “kuma ku bu mansi?” (como estás?) num crioulo quase perfeito. 

Toda a rotina, apesar de cansativa vai deixar saudades. Desde o ritmo e animação do grupo coral da paróquia em que nos inserimos, até à emoção e ambiente frenético dos jogos de futebol entre bairros que se juntavam a comunidade. 

Parafraseando uma das orações que fizemos durante esta missão posso afirmar com convicção que esta comunidade, as amizades que aqui fizemos e as pessoas que aqui conhecemos “tornaram-se família. Daquela que não se vê nos retratos nem aparece sorridente nos dias de Natal. Tornaram-se família enraizada dentro de mim, apesar de nunca aparecerem nas fotografias”. 

Todos os dias quando acordamos e saímos de casa encontramos em letras bem grandes num muro do outro lado da rua, uma frase que diz “CUMURA PAZ E BEM” e tem sido este o mote da nossa missão: semear paz e bem nesta comunidade que tão bem nos acolheu.

Só me resta agradecer, a toda a comunidade, ao Frei António por toda a disponibilidade e amabilidade, às Irmãs pelas palavras amigas e sábias, a toda a equipa do Hospital de Cumura pela paciência, a todas as crianças por nos procurarem e serem um motivo de alegria nos nossos dias e ao grupo de jovens por toda a amizade, experiências e vivências que fomos partilhando em conjunto. Aproveito também para agradecer ao Centro Pastoral Universitário, especialmente ao Padre Eduardo Duque e à coordenação do Projeto por todos os ensinamentos que nos foram dando ao longo da caminhada, com eles conseguimos ser missão e semear a nossa semente, junto daqueles com quem nos cruzamos na vida. 

A verdade é que já vemos terra, numa travessia que poderia ter mais umas milhas de oceano, mas prometemos dar tudo e entregar a nossa alma e coração nestes últimos dias de missão. A partir de hoje podemos dizer que Cumura também é nossa casa. 

António Rocha, Mestrado Integrado em Engenharia Biomédica, UMinho 

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