Os Jovens e a Catequese

A crença na educação como instrumento de transformação e perfeição quase indefinida do ser humano remonta aos primórdios da modernidade, podendo encontrar-se estas ideias no espírito que animou o humanismo entre os finais da Idade Média e os inícios da Moderna. Os humanistas acreditavam firmemente na perfetibilidade quase infinita do ser humano que, dotado de uma natureza essencialmente racional e boa, poderia ser educado no sentido em que se pretendesse, sempre que dispusesse do devido método.

Esta crença, posteriormente, converteu-se quase em dogma. No entanto, para os humanistas, embora a tendência para a perfeição estivesse presente em cada natureza humana, não poderia materializar-se sem ser introduzida pelos adultos.

Por um lado, recomendava-se seguir a natureza para educar as crianças e, por outro lado, procurava-se detê-la, de forma a que a criança fosse introduzida no mundo civilizado sob a orientação e o exemplo que os anciãos ofereciam. Aqui se encontra um dos fios condutores da ideologia moderna da educação.

Houve, porém, muitos autores que se separaram desta corrente, dando maior destaque à natureza das crianças, que acreditavam estar repletas de potencialidades e possibilidades.

A natureza humana é “sábia, honesta e santa”, afirmou Comenius. Para que essa natureza fosse educada da melhor forma, considerava que não era necessário que ela entrasse no mundo, observando e seguindo o exemplo dos anciãos, mas o que ela precisava era de saber as coisas que a natureza física contém. “Educar corretamente os jovens”, escreveu Comenius, “não é imbuí-los de palavras, frases, sentenças e opiniões tiradas dos autores, mas despertá-los para o entendimento das coisas”.

O mundo – que se há de frequentar mais tarde e que é necessário conhecer para fazer parte dele – não deve servir mais de exemplo. Esse exemplo será agora proporcionado pela escola, em que se ensinará, a todos e a cada um, as disciplinas mais úteis e práticas à sociedade. “Que em todo o local (cidade, vila ou lugar) – diz Comenius – se abra uma escola para educar os jovens... em todas as dimensões da vida”. Naturalmente, este objetivo é seguramente diferente daquele perseguido pelos humanistas e Locke. Agora já não se pretende o que estes tanto almejavam e que visava educar o futuro cavalheiro, ensinando-lhe os bons costumes e os conhecimentos mais apropriados à sua nobre condição. Com a escola pretende-se formar toda a humanidade no conhecimento mais útil e prático. Ou seja, nos diversos ofícios e também no que se refere aos assuntos religiosos.

Embora o discurso educativo moderno tenha sido tecido com o fio que vai dos humanistas a Locke e a Comenius, há nele duas formas de entender a sociedade: de facto, enquanto que para os humanistas e Locke, a educação respondeu às necessidades de uma sociedade hierárquica, na qual a nobreza era o exemplo da boa cultura, o projeto educativo reformista, representado por Comenius, estava vinculado a uma sociedade baseada no mérito que cada um demonstrava na realização das suas atividades. “Será mais conveniente - diz Comenius – estar sempre ocupado ... para não deixar qualquer ocasião para a preguiça”. Este Os jovens pedem uma Catequese mais próxima último discurso será, como se sabe, o que terminará por triunfar.

Bem, poderíamos continuar a história... que nos levaria a Rousseau, Marx, Proudhon, etc., que se propuseram criar o homem novo a salvo de qualquer tradição anterior, de forma a construir uma sociedade nova, moral e socialmente organizada. Sabemos que este caminho ficou plasmado nos valores da liberdade, igualdade e fraternidade, que, por sua vez, encontraram a expressão máxima na sociedade democrática e industrial.

Ora, o que se mencionou até agora vem a propósito do que se referia no Questionário online destinado aos jovens ( junho--dezembro 2017), de que “a catequese nem sempre goza de boa reputação entre os jovens, já que lhes lembra ‘um percurso obrigatório e não escolhido na infância’” (n.o 190).

A “escolarização da catequese” é fruto de uma colagem da Igreja ao modelo educativo, a qual pretendeu, durante muito tempo, proporcionar os conhecimentos imprescindíveis morais para conviver em sociedade. Percebeu-se, porém, que se este modelo funcionou nas sociedades anteriores, hoje, não responde aos desafios que os jovens exigem. Como refere a Evangelii gaudium: o anúncio de Cristo é vocação fundamental da comunidade cristã. Deste anúncio faz parte o convite aos jovens para reconhecerem na sua vida os sinais do amor de Deus e descobrirem a comunidade como lugar de encontro com Cristo (n.o 164).

A catequese converteu-se, para muitos, num dos instrumentos principais para criar legitimamente uma certa ordem de pensamento, talvez demasiado funcionalista, formando pessoas seguidoras de um estilo de ser cristão numa sociedade monolítica. Por sua vez, por meio dessa ação catequética, os indivíduos não apenas compreenderiam a importância da sua missão na Igreja, como também conheceriam as regras e os meios que teriam disponíveis para a desenvolver na sociedade. E, assim, compreenderiam que os seus interesses pessoais eram os mesmos que os da comunidade à qual pertenciam.

Creio que esta forma de catequese – “colada” por um lado à vertente humanista e, por outro, seguidora do projeto educativo reformista – pode não ser a que melhor se adequa aos tempos de hoje. Rossano Sala chama a atenção para a importância da catequese como um encontro. Um encontro que supõe relação, afetividade, inteligência e proximidade. Se qualquer encontro tem como pressuposto uma linguagem comum, também a catequese, que é o encontro com Cristo, deve cuidar da linguagem e da metodologia.

A catequese, entendida como um encontro com Cristo, deixa de ser uma “aula” e passa a assumir o “método do discernimento”, levando o catequista e o catequisando a sentir que ambos partilham o mesmo caminho; que são companheiros de viagem, ambos à escuta da mesma Voz; que sabem alterar o ritmo do passo, se for o caso, já que a escuta altera o comportamento; que sabem conversar e fazer silêncio, para escutar melhor; e, pouco a pouco, ambos vão descobrindo que é o Senhor quem lhes renova as forças e que não os deixa desfalecer (Is 40, 30-31).

Pe. Eduardo Duque
(Pastoral Universitária da Arquidiocese de Braga e Serviço Nacional de Pastoral do Ensino Superior)

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