Caminhar no Gerês: uma viagem de sensações, sentimentos, histórias e sorrisos

Uma caminhada intensa pode requerer de um caminhante uma preparação física, mas também de espírito. A pessoa sente-se motivada a ir porque está pronta para enfrentar as adversidades do caminho.

Algo diferente ocorre quando a caminhada nos convida. Ao invés de nos prepararmos para ela, é a caminhada quem nos prepara. E quando alcançamos a meta, sentimo-nos prontos para enfrentar as adversidades do caminho da vida.

É assim no Gerês. A caminhada não te obriga a ser um atleta experiente ou alguém habituado a lidar com muitas horas de marcha. Muito pelo contrário. É até melhor não possuir experiência alguma, pois o caminho te prepara da melhor forma, porque te trabalha de dentro para fora, aguçando os quatro sentidos.

A começar pelo olhar, a vista não alcança o deslumbre da imensidão verde e castanha, que se confunde com o barro e o azul do céu. Como é lindo o Gerês! A paleta das cores toca a alma e alegra o coração. Surpreende aqueles tons de amarelo e vermelho surgindo no meio do nada ao piscar dos olhos.

O silêncio nos permite ouvir o vento tocar as folhas com delicadeza o suficiente para lhes fazerem ecoar um som como de aplausos. E elas nos aplaudem enquanto passamos, como que felizes por estarmos ali.

Ou será que aplaudem o canto dos pássaros? Eles estão a cantar, afinal. Exibindo a sua afinação, cada um, ao seu modo, emite os seus sons, compondo uma trilha perfeita para a caminhada que está diante de nós.

O cair das águas emite um som potente que faz bater o coração; um som que preenche o corpo e a alma. É divino!

Outro encantamento que nos toma, vem do cheiro verde da mata, de terra húmida, de pureza do ar. Os pulmões se enchem na mais pura fonte enquanto nos deliciamos com a melhor experiência olfativa que não se compara ao mais caro perfume.

O Gerês tem textura e é possível tocá-lo. Troncos, pedras, água, folhas, flores, todas nos promovem uma sensação de força e delicadeza ao mesmo tempo. Aquela imponência da natureza, com toda sua grandiosidade, permite que a toquemos e nos deixa desfrutar da sua magnitude ao simples esticar dos braços. Não é maravilhoso? Sentir a água gelada das cascatas escorrer nos pés enquanto se é tocado pelo vento fresco e pelo calor do sol é um deleite!

Tudo isso, por si só, é uma perfeição, cuja plenitude é alcançada pelos outros pés que estão ao nosso lado, igualmente a caminhar, com suas sensações e sentimentos, compartilhando histórias e sorrisos, e contemplando as dádivas do Gerês.

Estamos prontos agora para seguir, para enfrentar as tantas adversidades do dia-a-dia, mas não sem deixar um pouquinho de nós lá, e trazer muito do Gerês em nós.

Giro

“Quão bonito é o Gerês!”

Diria um brasileiro

“Bué de giro!” Era a expressão

Que usaria um português.

É assim que pretendo contar

Essa estória pra vocês.

 

Muita beleza se vê ali

Naquela paz sem igual

Com profundeza sentir

Um toque espiritual

 

A certeza divina

Expressa pela criação

De tão bela obra-prima

Ao alcance de nossas mãos.

 

As belezas bastariam

Se fossem elas só

E até serviriam,

Mas não foi o único pró.

 

As pessoas que lá estavam

Realizando a caminhada

Com a beleza contrastavam

Engrandecendo às risadas

 

Eram conversas meio soltas

Sobre tudo, e também nada

De rotina, e até bobas,

Mas ao lado da passada.

 

Teve também quem parou

Ouviu e refletiu

Quem observou o canto dos pássaros

Viu uma flor e sorriu

 

Houve momento de tristeza

Dor e solidão

Mas que trouxeram a certeza

Da importância da reflexão

 

Aprendemos que os riscos

Fatalmente virão

É uma questão de esperar por eles

Estejam prontos ou não.

 

Respirar o oxigénio

Purinho, direto da fonte

Ver uma cascata (ou cachoeira)

Ao atravessar uma ponte

 

Aprendi com um egípcio que a casa

É onde a família está

E que não importa onde esteja

Com os seus terá seu lar

 

Eu vi um guineense

Sorrir com o olhar

E extravasar pelo sorriso

A beleza daquele lugar

Repetimos aos caminhantes 

“Shalom, Meu irmão!”

Desejando alegremente a paz

Pedimos o amor a eles

Momento que não esquecerei jamais

 

Nos fartamos de comida

Mas também de muito amor

A partir da palavra ouvida

De Deus, nosso Senhor

 

Foram belas as paisagens,

E também o que ficou

Em nós, como caminhantes

E no Gerês, o que de nós ecoou.


Kelly Coelho
| Doutoramento em Direito (UMinho)

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